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Comentários desativados em Desconto para pagamento em dinheiro não constitui infração à ordem econômica
Por: Camilla Goes: Advogada da Área Hospitalar do escritório Imaculada Gordiano Sociedade de Advogados – LEXNET Fortaleza. Assessora jurídica da Associação Cearense dos Hospitais do Ceará, de hospitais da rede privada, clínicas de imagem, laboratórios, cooperativa de médicos e empresas do terceiro setor na área da saúde pública. Pós-graduação em Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Pós-graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Curso Juris.
A diferenciação de preços em razão da forma de pagamento efetuada pelo consumidor tornou-se uma vedação a partir da orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.479.039 – MG, REsp 1.133.410 – RS, REsp 1.610.813 – ES) – STJ, que concluiu pela abusividade desta prática. Para o STJ, o desconto para pagamentos em dinheiro configura conduta ilegal tanto quanto o aumento do preço quando da ocorrência de pagamento com cartão de crédito. Segundo os Ministros, em ambas as condutas, há discriminação de adquirentes pela forma de pagamento, com base nas prerrogativas determinadas pelo Código do Consumidor combinado com os dispositivos preconizados pela Lei de Defesa da Concorrência.
Ocorre que, se a premissa para a defesa e proteção do consumidor é garantir-lhes acesso a um mercado justo, saudável e competitivo na medida de viabilidade para o exercício de escolha no momento de realizar aquisições a vedação do desconto para pagamento em dinheiro interfere de forma substancial no direito de escolha do consumidor pela forma de aquisição de produtos e serviços que lhe seja mais vantajosa.
Tal fato se dá porque, diferente do aumento do preço (ainda que em um percentual ínfimo) quando do pagamento em cartão de crédito, a prática de dar desconto ao adquirente que realiza sua compra em dinheiro não se enquadra em nenhuma das hipóteses legais que configuram a chamada discriminação de adquirentes e que importam em infração à ordem econômica.
A lei de defesa da concorrência é muito clara ao dispor em quais situações a prática comercial configurará infração à ordem econômica, vez ser necessário que seja produzido pelo menos um dos seguintes efeitos elencados na referida norma: limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; dominar mercado relevante de bens ou serviços; aumentar arbitrariamente os lucros; exercer de forma abusiva posição dominante.
Desta forma, não há que se falar em ilegalidade da conduta, porque simplesmente não se produz os efeitos elencados na lei. E sem tipicidade, não há infração de nenhuma natureza jurídica: nem em direito penal, nem em direito civil, tampouco em direito empresarial!
Inexiste, portanto, base legal que corrobore o entendimento jurisprudencial quanto à infração à ordem econômica quando da prática de desconto por pagamento em dinheiro. A intenção do empresariado, em verdade, é fazer com que a economia sobreviva apesar do período de crise generalizada que assola a sociedade brasileira. É importante sempre repisar à exaustão que o direito não pode se distanciar da realidade, sob pena de tornar-se letra morta e não produzir os efeitos que a sociedade anseia.
E neste ponto, é de grande relevância observar que o comércio tentou incentivar o consumidor a preferir comprar a dinheiro, sem prejuízo aos que optavam em utilizar-se de crédito (pois o preço apenas variava para menor a quem efetuasse pagamento em cash). Tal postura está consonante à ideia precípua do Direito Empresarial: valer-se da atividade empresária para fazer crescer a economia.
A tentativa, pois, do Judiciário de proteger as relações de consumo acabou por ferir um dos direitos precípuos do consumidor, que é a liberdade de escolha. Tal direito atrai conceitualmente as hipóteses civilistas de vício do negócio, ou seja, o exercício da liberdade plena no momento de adquirir um produto ou um serviço. De tal sorte que a informação é que deve ser adequada e imprescindível para que o consumidor saiba exatamente o que está adquirindo, sem quaisquer enganos.
O desconto para compras em dinheiro não chega a ser um benefício ao consumidor que assim prefere pagar, mas é verdadeiramente a adequação de conduta, pois é evidente que o preço de um produto ou serviço é composto de um percentual significativo relativo à estrutura operacional das máquinas de cartão de crédito. E tal conduta não é errada nem viola a ordem econômica, porque simplesmente não há outra forma de se calcular preços.
Quando se oferta modalidades diversas de pagamento, quem deve escolher livremente o que lhe é mais vantajoso é o sujeito que consome. Havendo a parametrização de tais modalidades como se fossem iguais, ignorando por completo que não são, haverá notório prejuízo ao próprio consumidor, que custeará com todos os encargos advindos do estabelecimento que se valer da sistemática de cartão de crédito, mesmo preferindo realizar suas compras a dinheiro. Na verdade, a imposição pela igualdade absoluta de preços não é mais para o fornecedor, mas para o próprio consumidor.
Assim, a vedação de diferenciação de preço acabou por prejudicar as relações de consumo, porque ignorou o direito de escolha do consumidor pela forma de aquisição que lhe fosse mais vantajosa, em nítido prejuízo pela elevação dos preços, que serão sempre integrais, considerando todo o custo de operacionalização, mesmo quando a aquisição for realizada por diferente modalidade de pagamento que não utilize tal sistemática, ou seja, nas compras a dinheiro.