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Comentários desativados em A INFLUÊNCIA DO NCPC NOS PRAZOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA DE EMPRESAS
Por: Breno Augusto Pinto de Miranda, sócio do escritório Elarmin Miranda Advogados Associados, LEXNET Cuiabá. Administrador Judicial. Conselheiro Estadual da OAB/MT e Membro da Comissão Estadual de Estudos da Lei de Recuperação de Empresa e Falência da OAB/MT. Membro associado ao IBAJUD.
- INTRODUÇÃO
Com o advento do Novo Código de Processo Civil, eclodiu fervorosa discussão doutrinária e jurisprudencial sobre os seus impactos no sistema da insolvência empresarial, motivo pelo qual, sem a intenção de esgotar o tema, o presente artigo se propõe a lançar algumas ideias sobre a aplicação ou não, principalmente do artigo 219/NCPC, nas ações de recuperação judicial e falência, sempre tendo como norte a segurança jurídica e a preservação da unidade lógica da recuperação judicial.
- DA INFLUÊNCIA DO NCPC NOS PRAZOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA DE EMPRESAS
O novo diploma processual brasileiro, instituído pela lei nº 13.105, de 16 de março de 2016, trouxe importante modificação acerca da contagem dos prazos processuais, alterando-se a malfadada contagem em dias corridos do CPC de 1973, ou seja, no cômputo dos prazos, fixados por lei ou pelo juiz, considerar-se-ão apenas os dias úteis, consoante a seguinte disposição normativa:
“Art. 219: Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Parágrafo único: O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais”
Inegavelmente essa alteração foi uma grande vitória para a classe dos Advogados, sendo, inclusive, uma reivindicação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil a então Comissão Especial da Câmara dos Deputados, que examinava e se debruçava sobre o PL 8046/10, que deu origem ao Novo Código de Processo Civil, haja vista que a forma da contagem dos prazos, tal qual disciplinava o CPC revogado, causava absoluto e desleal desequilíbrio processual, prejudicial às partes e aos advogados, no exercício de seu mumus público.
Todavia, faz-se necessário analisar a sua influência ou aplicação nos procedimentos da Lei de Recuperação Judicial e Falência, por se tratar de norma especial e de natureza mista, ou seja, é formada tanto por normas de direito material quanto de direito processual, mas especificamente em relação ao modo e a forma de contagem dos prazos é omissa.
Em razão dessa flagrante lacuna normativa, cabe a primeira reflexão, no sentido de que deveria ser aplicada a nova regra do CPC, especialmente no que tange a contagem dos prazos processuais, em razão do caráter supletivo e subsidiário da aplicação da regra processual, prevista no artigo 15 do NCPC, mas, por obvio, a discussão aqui não se esgota.
Segundo as lições do Juiz de Direito, Dr. Danio Carnio da Costa, titular da Primeira Vara de Falências, Recuperações Judiciais e Conflitos relacionados à
Arbitragem de São Paulo, em artigo publicado no Jornal “Valor Econômico”, de 02 de maio de 2016, “devem ser aplicadas à recuperação das empresas regras de contagem de prazos estabelecidos no novo CPC”, mas o doutrinador fez a ressalva que a nova regra aplica-se apenas aos prazos processuais, afastando-se para os casos que se referem de prazos materiais, como, por exemplo, o prazo de 180 dias de suspensão das ações e execuções ajuizadas contra a recuperanda.
Em posição absolutamente oposta, o Professor Sérgio Campinho, em palestra proferida na sede da OAB do Rio de Janeiro, em outubro de 2016, defendeu a tese da não aplicação da contagem dos prazos em dias úteis, para as ações previstas no sistema de insolvência brasileiro, sob o fundamento de que os prazos da Lei nº 11.101/05 são peremptórios e contínuos, bem como que o art. 189 da citada Lei
determina a aplicação do CPC no que couber, isto é, no que for compatível ao procedimento da recuperação judicial e falência.
Sustenta, ainda, que o sistema da Lei nº 11.101/05 repele a aplicação dos prazos em dias úteis, pois um dos princípios do instituto falimentar é a celeridade dos processos de recuperação judicial e falência, conforme previsão legal específica (art. 79), o que afastaria a hipótese de alargamento dos prazos processuais.
O Emérito Professor Manoel Justino Bezerra Filho, em artigo publicado no Jornal Valor Econômico, ao admitir a aplicação na nova regra processual as ações de recuperação judicial e falência, adverte que: “o exame apenas do que seria prazo processual não será suficiente para encontrar a correta aplicação da lei”, estando absolutamente correta esta afirmativa, pois atualmente o cerne da questão é saber quando será aplicada a contagem em dias úteis, quando será em dias corridos, ou melhor, quais os prazos, da lei de recuperação judicial, são de natureza processual ou material.
Nesse sentido, o Desembargador Manoel Justino propõe a classificação dos prazos processuais em a) material absoluto e b) material relativo, sendo que o primeiro seria “aquele que corre de forma contínua porque não sofre interferência de outros atos ou prazos processuais em seu decurso” e, o segundo – material relativo
– seria “aquele que depende, sem dúvida, da contagem de outros prazos de natureza processual (…), pois será completado a partir de uma série de atos processuais”.
Seguindo essa linha de raciocínio, a contagem dos prazos seria em dias corridos, sem aplicação do NCPC, para a hipótese de apresentação de relatórios de atividades mensais (art. 27, inciso II, alínea a), publicação de edital de convocação de Assembleia de Credores (art. 36), prazo de 90 dias para interpelar o administrador judicial, sobre contrato firmado na falência (art. 117), dentre outros. Já a contagem em dias úteis seria para as seguintes hipóteses, por exemplo, o prazo de 180 de suspensão das ações e execuções (art. 6º, §4º).
Com efeito, embora o que poderia ser aparentemente tranquilo, verifica-se que entre os doutos não há posição unânime, por exemplo, em relação a natureza do prazo de 180 de suspensão das ações e execuções, como também a natureza do prazo de 60 dias para apresentação do plano de recuperação judicial, o que causa, sem sombra de dúvida, uma insegurança jurídica aos participantes do processo de recuperação judicial e falência, sejam os magistrados, promotores, advogados,
administradores judiciais, devedor e credor, sendo esta a maior preocupação do Professor Sérgio Campinho, ao defender a não aplicação do novo CPC às ações previstas no sistema falimentar.
Registre-se, ainda, que a jurisprudência pátria tem se inclinado a não aplicar o art. 219 do NCPC para a hipótese do prazo de 180 dias denominado como “automaticstay” ou “stayperiod”, previsto no art. 6º, §4º, da Lei n. 11.101/05, inclusive com decisões do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o que demostra, à exaustão, a insegurança nos procedimentos da lei de recuperação judicial, após a vigência do NCPC.
Em razão dessa celeuma e dúvida na interpretação e aplicação das leis em voga, importante destacar, numa comparação analógica, que diversos Tribunais do país afastaram a aplicação do art. 219, do NCPC, do microssistema da Lei nº 9.099/95 – Juizados Especiais -, tendo, inclusive, o Conselho Nacional de Justiça firmado posição contraria a aplicação a nova regra, cuja insegurança motivou a apresentação de alteração legislativa na Câmara Federal, com a finalidade de que a lei especial caminhe no mesmo sentido da norma geral processual, a fim de que não cause, como efetivamente está causando, a insegurança jurídica em relação ao procedimento a ser adotado para a busca da efetiva prestação jurisdicional.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, considerando este cenário de posições antagônicas entre os doutos, não seria ideal esperar pela posição dos Tribunais a respeito do que vem a ser prazo material ou processual em matéria de recuperação judicial e falência, ou melhor dizendo, em que hipótese da Lei de “Recuperação Judicial e Falência de Empresas” os prazos serão computados em dias úteis ou corridos.
Talvez, para assegurar a segurança jurídica de todos e, ainda, garantir a preservação do próprio instituto da recuperação judicial e falência nos moldes da lei especial, deve-se promover, por quem de direito, a necessária alteração da lei nº 11.101/05, a fim de colocar uma pá de cal nessa discussão surgida com o advento do Novo Código de Processo Civil.
- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Vade Mecum. 20 ed. São Paulo: Rideel, 2015, p. 1367-1384.
BRASIL. Lei n° 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Brasília, DF: Senado, 2015.
BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Novo CPC tem efeito nos prazos materiais e processuais da recuperação judicial. [S. l.]: [S.ed.], 2016. Disponível em: <conjur.com.br> Acesso em: 10 dez 2016.
WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. et al. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil: Artigo por Artigo. Revista dos Tribunais, 2015.