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Por Gustavo Zimmermann, consultor da LEXNET
Mudanças da natureza da liderança provocadas pela IA
“Esse artigo sintetiza as ideias expostas no artigo “A natureza da liderança deve mudar quanto mais decisões a IA tomar” dos professores, Tomas Chamorro Premuzic, Michael Wade e Jennifer Jordan publicado na Harvard Business Review de 01/03/2018. Minha interferência no seu conteúdo limitou-se a eliminar pequenas passagens consideradas menos relevantes e raras mudanças de palavras sem prejuízo do raciocínio dos autores”.
Ao apresenta-lo, pretendo ressaltar que a crescente disponibilidade de informações digitalizadas, a cada vez maior sofisticação dos algoritmos e o progressivo uso da inteligência artificial e do aprendizado de máquina na tomada de decisões, com seus impactos disruptivos e gerais, exigirá mudanças no caráter das lideranças dos negócios em geral e, por conseguinte nos negócios jurídicos e em nossos escritórios.
“É tentador considerar a inteligência artificial (IA) uma ameaça para a liderança humana”. Afinal, o intento primordial da IA é aumentar, melhorar e, em última instância, substituir a inteligência humana, ainda amplamente vista como nossa principal vantagem competitiva.
Certamente é bastante provável que a IA irá suplantar muitos dos aspectos mais “rígidos” da liderança, isto é, as partes responsáveis pelo processamento cognitivo puro de fatos e informações. Concomitantemente, é previsível que a IA também fará com que uma ênfase maior seja dada aos elementos “flexíveis” da liderança, ou seja, nos traços de personalidade, atitudes e comportamentos que permitem às pessoas ajudar os outros a atingir um objetivo comum ou propósito compartilhado.
Uma mudança desse tipo, da prevalência dos elementos rígidos de liderança para flexíveis não é exclusividade da nossa era. Estudos meta-analíticos avaliando 50 anos de pesquisas sugerem que traços de personalidade como curiosidade, extroversão e estabilidade emocional são duas vezes mais importantes do que o QI quando se trata de prever a eficácia da liderança (negrito meu).
A liderança evoluiu ao longo de milhares de anos e por isso seus princípios dificilmente mudarão. Por outro, não há como negar a influência poderosa que as mudanças ambientais podem ter na reconfiguração das capacidades e dos comportamentais cruciais que definirão líderes eficazes (e os inoperantes). Em algum ponto de nossa história, provavelmente com o advento da linguagem, a perspicácia da liderança passou de uma capacidade física para uma cognitiva, valorizando a inteligência e a expertise em detrimento da força e do vigor. Do mesmo modo, pode-se esperar que a atual revolução da IA automatize e transforme em commodity o aspecto da liderança baseado em dados, delegando aos humanos os aspectos flexíveis da liderança.
De maneira consistente, nossa pesquisa indica que em uma era de IA caracterizada por uma intensa ruptura e mudanças rápidas e incertas, é preciso repensar a essência da liderança eficaz. Certas qualidades, como um profundo domínio de um assunto, determinação, autoridade e concentração em tarefas de curta duração estão perdendo seu prestígio, ao passo que outras, como humildade, adaptabilidade, visão e envolvimento constante provavelmente passarão a ter um papel fundamental em tipos mais ágeis de liderança. A seguir, apresentamos um olhar mais atento a estas competências.
Humildade. Em tempos de rápidas mudanças, ter ciência do que você não sabe é tão valioso quanto saber o que você domina. Infelizmente, líderes frequentemente são impedidos de aprender sobre novos desenvolvimentos por conta do intenso volume e variedade de novas informações que são coletadas diariamente. Líderes na era da IA precisam estar dispostos a aprender e abertos a procurar input tanto dentro como fora de suas organizações. Precisam ainda confiar nos outros para que venham a saber mais do que já sabem. Esse conhecimento pode muito bem vir de alguém 20 anos mais jovem ou três níveis abaixo na hierarquia da empresa. Na era da IA, um líder eficaz compreende que o fato de alguém possuir um status inferior ou ter menos experiência não quer dizer que não pode oferecer uma contribuição fundamental.
Ser humilde pode soar inconsistente com a necessidade de se passar uma imagem de confiança e autoridade. Ainda assim, sempre houve uma relação frágil entre confiança e competência real, de tal modo que verdadeiros especialistas muitas vezes são mais humildes do que pessoas que possuem pouca ou nenhuma expertise.
Adaptabilidade. Em nível organizacional, adaptabilidade significa estar pronto para inovar e reagir a oportunidades e ameaças conforme elas surgem. Em nível pessoal, quer dizer estar aberto a ideias novas, mudando de opinião mesmo quando isso machuca ou ameaça o ego de alguém, e ser capaz de efetivamente transmitir esse ponto de vista revisado para as partes envolvidas importantes, incluindo colegas, equipes e clientes. Na era da IA mudar de ideia, algo que frequentemente pode ser visto como um sinal de fraqueza ou ausência de convicção deve ser percebido como um ponto positivo quando melhora a tomada de decisão. Líderes adaptáveis não têm medo de se comprometer com um novo curso de ação quando a situação justificar, e sua adaptabilidade lhes permite enfrentar os desafios preocupados em aprender, não em ter razão.
Visão. Visão sempre desempenhou um papel importante na liderança efetiva. Mas na era da IA caracterizada pela tecnologia veloz e pela ruptura de modelos de negócio, uma visão precisa é ainda mais fundamental, pois há menos clareza entre adeptos, subordinados e empregados em relação ao caminho que deve ser seguido, ao que deve ser feito e às razões para isso. Líderes com uma visão clara têm respostas convincentes e significativas para tais perguntas e são mais competentes para comunicarem-nas de modo eficaz. Ademais, visão permite a um líder implementar transformações organizacionais necessárias sem ceder a interesses imediatos.
Envolvimento. Por fim, para ser bem-sucedido na era da IA, um líder deve manter-se constantemente envolvido no ambiente que o circunda para que possa tanto estar em harmonia como se adaptar aos indícios e não aos barulhos — que irão ou ameaçar (sabotadores) ou apoiar (potenciais parceiros) sua visão. Líderes ágeis precisam estar envolvidos, mas também precisam encontrar maneiras para manter suas equipes envolvidas, especialmente quando a situação fica complicada e o caminho torna-se árduo.
Isso tudo indica que a liderança é radicalmente diferente na era da IA? Não, mas existem duas distinções fundamentais. Primeiro, as capacidades rígidas dos líderes continuarão a ser eclipsadas por máquinas inteligentes, ao passo que suas capacidades flexíveis se tornarão cada vez mais importantes. Segundo, enquanto características de liderança atemporais como integridade e inteligência emocional prosseguirão, sem dúvida, sendo importantes, líderes na era da IA precisam ser humildes acerca das contribuições dos demais, adaptáveis aos desafios que se apresentarão em seus caminhos, firmes em suas visões em relação ao destino final desses caminhos, e constantemente envolvidos no mundo em transformação que os cerca.”