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Por: Gabriel Mendes, advogado da Corpag Services Group, Prestador de Serviço LEXNET
Planejamentos sucessórios e o caso da família Reynolds
No início do mês de setembro, faleceu Burt Reynolds, astro de Hollywood que atuou em filmes como Boogie Nights, Amargo Pesadelo e Agarra-me Se Puderes. Eventos como esse repercutem na mídia, fazendo com que sites de reportagens discorram sobre os feitos realizados durante sua carreira, como uma espécie de homenagem, ou reconhecimento, aos serviços que prestou à sociedade.
Entretanto, após sua morte, noticiou-se o seguinte fato “Burt Reynolds deixa filho (Quinton Reynolds) único fora de herança milionária”. Uma manchete dessas não é recebida com bons olhos, afinal de contas, quem excluiria intencionalmente seu filho de uma herança milionária que poderia lhe oferecer oportunidades melhores na vida? Respondemos: qualquer milionário que more em um país que reconheça o Trust como instituto jurídico válido.
A despeito da conotação dada ao fato pela mídia brasileira, vale a pena traçarmos um paralelo sobre como a mídia dos EUA endereçaram a questão. A Revista PEOPLE, de início, já demonstra uma conotação diferente: “Lenda das telonas, Burt Reynolds, deixa seu filho fora de sua herança – mas não o deixou desamparado” (tradução livre para que não se perca o contexto). Em seguida, com um trecho do próprio testamento, explica que Burt decidiu por deixar sua herança integralmente à sua sobrinha, pois seu filho já está amparado por um Trust.
No noticiário brasileiro, comenta-se, ainda, que seu filho foi deixado de fora da herança, pois já havia sido agraciado com um fundo de investimentos e, também, que isso é comum nos EUA.
Essa situação se justifica com duas características que distinguem os EUA do Brasil: (i) em primeiro lugar, não possuem a chamada “herança legítima”, a qual obriga que 50% de todo o patrimônio do falecido seja transmitido aos seus herdeiros legítimos (cônjuges e filhos, em termos gerais) e (ii) o imposto incidente sobre transmissão via herança (ITCMD) pode ser muito punitivo, a depender do volume do patrimônio deixado e o estado no qual o falecido residia (em razão de alíquotas estaduais adicionais).
Juntando essas duas características ao fato de os Estados Unidos reconhecerem o Trust como instituto jurídico válido, surge um leque de planejamentos sucessórios extremamente eficazes. Nesse cenário, é comum que doações sejam feitas em vida a um Trust, o qual terá beneficiários determinados e/ou determináveis (no caso de Burt, seu filho) que receberão os recursos ou bens detidos pelo Trust da forma determinada pelo Settlor, no caso em tela, o próprio Burt.
Com essa ferramenta, o Settlor pode, inclusive, optar por diferir a transmissão integral de seu patrimônio, criando uma espécie de “conta-gotas” ou até mesmo condicionantes. Exemplos desses casos são Trusts que somente distribuirão seus recursos após o beneficiário completar 18 anos ou, então, graduar-se em uma faculdade.
Outra situação corriqueira na qual o Trust pode desempenhar um papel vital é aquela na qual o Settlor possui um filho(a) com problemas de dependência química ou que, por qualquer razão que seja, não vá saber administrar o dinheiro que receberia de herança. Nesses casos, o Settlor pode determinar, por exemplo, que mensalmente serão distribuídos apenas 5% dos recursos detidos pelo Trust aos beneficiários ou, ainda, que o Trust deverá fazer distribuições em forma de custeamento de despesas médicas relativas ao tratamento contra dependência química.
Sendo assim, Burt pode ter estabelecido um Trust ao qual doou, por exemplo, 75% de todo o seu patrimônio e determinou que, na data de seu falecimento, todo esse patrimônio fosse automaticamente transmitido ao seu filho único, de modo a evitar a tributação que incidiria em uma transmissão regular pelo falecimento.
Vale ressaltar que, isso não significa que as distribuições feitas pelo Trust aos beneficiários não serão tributadas, apenas que elas podem ter impactos tributários mais vantajosos que o imposto sobre a herança.
Sendo assim, Quinton dificilmente foi deixado desemparado por seu pai.