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Por Daniel Meirelles Ferreira, advogado sócio do escritório Meirelles Ferreira Advogados, LEXNET Brasília.
Por que Perpetuar Empresa Familiar é Tão Complexo?
Para início de conversa, façamos um comparativo entre a importância da empresa familiar para o mercado versus a sua taxa de mortalidade, especialmente durante o processo de transição de uma geração para outra. Aproximadamente 85% das empresas no Brasil são familiares; 15 empresas familiares brasileiras estão entre as 500 maiores do mundo; mais de 60% do PIB do setor privado da maioria das economias mundiais é produzido por empresas familiares; aproximadamente 61% das indústrias, 60% dos negócios varejistas e 56% das empresas de serviços são familiares; mais de 22 milhões de pessoas são empregadas em empresas familiares.
Na contramão, apesar de as corporações familiares serem responsáveis por movimentar, alavancar a economia do país e de ser a responsável pelo sustento de inúmeras famílias, a sua taxa de mortalidade é altíssima. Apenas 30% das empresas familiares alcançam a segunda geração de uma família, somente 15% a terceira e míseros 4% a quarta. Qual seria a razão para este cenário desanimador?
A principal causa de ruptura das empresas familiares decorre de conflitos gerados por membros da família que acabam impactando o negócio, como por exemplo, dissolução de casamento, morte inesperada do líder, emprego de parentes não qualificados e disputas pelo poder. O próprio estágio natural de desenvolvimento das empresas familiares nos mostra o porquê a família acaba comprometendo os resultados corporativos.
Na primeira geração, normalmente criada e gerida unicamente pelo fundador, as coisas caminham de forma mais uniforme e sem grandes conflitos, pois o controle ainda é concentrado. Já no segundo estágio, os filhos do fundador começam a participar da gestão da empresa enquanto outros não, por isso, o desafio passa a ser o desenvolvimento de um processo decisório compartilhado que atenda os objetivos da família e também dos negócios.
No terceiro estágio há um verdadeiro consórcio de primos e a saúde orgânica do negócio depende do controle da complexidade dos problemas familiares e da criação de um mercado de capital para toda a família sem impactar as riquezas primárias geradas pela corporação e que devem ser reinvestidas e utilizadas para agregar valor ao próprio negócio. Percebe-se, disso tudo, que balancear os laços familiares com a gestão dos negócios tem sido o maior desafio enfrentado pelas empresas de controle familiar. Não é tarefa fácil mostrar aos familiares o que cada um pode contribuir para a perenização do negócio e o que a empresa pode proporcionar para a família.
As expectativas individuais normalmente são desprezadas.
A família deve se preocupar com o seu comprometimento e disposição para colaborar, enquanto a gestão dos negócios, por outro lado, deve levar em consideração os valores e objetivos da família sem se esquecer de criar o hábito de avaliar as oportunidades de investimento e financiamento disponíveis no mercado para expandir os negócios para novas áreas, produtos ou serviços.
Para garantir a perenização e alta performance da empresa de controle familiar é imprescindível buscar, na medida do possível, satisfazer às necessidades de todos os stakeholders: (i) empregados – satisfação e segurança-; (ii) clientes – qualidade e eficiência; (iii) fornecedores –pagamento pontual e continuidade dos negócios-; (iv) acionistas/quotistas –dividendos, segurança no investimento e crescimento do capital-; (v) executivos – compensação, prestígio e poder-; (vi) comunidade –preservação do emprego e respeito ao meio ambiente-; (vii) governo –pagamento de tributos e empregos-; (viii) grupos minoritários –não discriminação-; e (ix) expectativas dos membros da família –segurança e sustento-.
Portanto, além da governança corporativa tradicional que garante responsabilidade corporativa, transparência por meio da prestação de contas aos acionistas e aos membros da família e equidade entre sócios e colaboradores, não despreze a importância da governança familiar, por meio da criação de um programa de preparação de herdeiros, a elaboração de código de conduta da família, a presença de um conselho de família permanente, a elaboração de pactos antenupciais, contratos de convivência e cláusulas restritivas no contrato social.
Com o auxílio de profissionais capacitados, multidisciplinares e antenados com a dinâmica das relações empresariais é possível equilibrar a complexidade das empresas familiares por meio da formalização de regras claras de convivência entre os sócios, herdeiros e sucessores e a criação de estruturas jurídicas e societárias que afastem eventuais brigas familiares da gestão dos negócios e minimizem a exposição do patrimônio da empresa dos riscos corporativos.
Nunca se esqueça: na empresa familiar a família e o negócio são conectados e se sobrepõem. Se um dos dois não for saudável, o outro será impactado (John Davis, professor da Harvard Business School).