Por: Douglas Felipe Marques da Silva Gomes: Advogado do Escritório de Assessoria Jurídica José Oswaldo Corrêa, LEXNET Rio de Janeiro. Pós-graduando em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG). Atuação voltada para o contencioso tributário administrativo e pareceres preventivos.
O princípio da Segurança jurídica visa resguardar as relações jurídicas licitamente estabelecidas – aquelas de acordo com o ordenamento jurídico – constituindo-se no subprincípio do princípio do Estado Democrático de Direito. No Direito Tributário tal princípio existe, principalmente, com a finalidade de evitar excessos por parte dos Entes Federados, posto ser considerado o Contribuinte a parte mais frágil na relação jurídico-tributária, em razão da prerrogativa que é inerente a Administração Pública, qual seja, a Supremacia do Interesse Público sobre o interesse privado.
Tal prerrogativa, embora louvável, não pode ser utilizada de forma absoluta, pois se aplicada de maneira equivocada certamente trará diversos prejuízos ao Contribuinte, influenciando diretamente na atividade empresarial, e, ao final, ao próprio Estado que deixará de arrecadar.
Pensando nisso, o Constituinte inseriu no Sistema Tributário Nacional a Seção II, que prevê as Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Tais Limitações não são exaustivas, mas ampliativas, consubstanciando-se em cláusula Pétrea em favor do Contribuinte.
Na seara do Direito Tributário a Segurança Jurídica é considerada pela nossa Suprema Corte como um Sobreprincípio (STF, RE 566.621), observada em 03 vertentes: (i) CERTEZA DO DIREITO (LEGALIDADE, IRRETROATIVIDADE, ANTERIORIDADE); (ii) INTANGIBILIDADE DAS POSIÇÕES JURÍDICAS (ATO JURÍDICO PERFEITO E DIREITO ADQUIRIDO); e, (iii) DEVIDO PROCESSO LEGAL.
Os princípios da legalidade, irretroatividade e anterioridade se encontram estabelecidos no art. 150, e incisos, da CRFB/88, na Seção das Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Já o ato jurídico perfeito e o direito adquirido visam assegurar a certeza do direito já contraído, evitando que uma nova lei interfira em atos pretéritos.
Por outro lado, o devido processo legal – que, na seara do Direito Tributário se verifica presente desde a elaboração da norma – conhecido como Devido Processo Legal substancial, ou seja, a inovação jurídica deve observar o atual ordenamento jurídico, evitando sua violação. Como exemplo, destacamos a Comissão de Constituição e Justiça – CCJ que verifica se a inovação jurídica está de acordo com o atual ordenamento jurídico, e, caso não esteja, sua tramitação deve ser paralisada, devendo ser decretada sua incompatibilidade e/ou inconstitucionalidade. Por outro turno, estando de acordo com as legalidades do mundo jurídico, sua tramitação segue, até ser publicada.
Todavia, muito embora a Segurança Jurídica devesse ser a base de um Estado Democrático de Direito, seu mandamento vem sendo mitigado e desrespeitado no cenário atual de crise financeira que passa o Estado do Rio de Janeiro, que já podemos chamar de verdadeira insegurança jurídica.
Tal fato ocorre pelo seguinte motivo: pairam suspeitas que agentes públicos tenham concedido benefícios fiscais de forma a gerar favorecimentos pessoais. E, como se sabe, no Direito Tributário, em função da Indisponibilidade do Interesse Público, a Administração não pode conceder benesses que não seja subjetiva, sob pena de violação ao Principio da Impessoalidade e desvio de finalidade, conforme previsão contida no art. 37, caput, da Constituição. Exemplificando: uma determinada Lei é editada, inicialmente para benefício de contribuintes suspeitos, mas acaba repercutindo em contribuintes que sequer têm noção da suposta corrupção, e que, se aproveitando da benesse legislativa, ao final poderão se ver prejudicados pela revogação e/ou suspensão dos benefícios anteriormente concedidos.
Objetivamente, destaca-se que para o caso concreto, em que pese todas as suspeitas de benefícios fiscais criados para favorecimento de sociedades empresariais específicas, até o presente momento não consta qualquer decisão transitada em julgado que corrobore esse entendimento, mas apenas uma liminar que havia sido concedida nos autos da Ação Civil Pública nº 0334903-24.2016.8.19.0001, e que, posteriormente, fora cassada em sede de Agravo de Instrumento nº 0064397-10.2016.8.19.0000.
O ponto nevrálgico, porém, para que se entenda a Insegurança Jurídica que passa o Rio de Janeiro, está na TAL liminar concedida nos autos da Ação Civil Pública que coibiu a concessão, renovação ou ampliação de benefícios fiscais.
A liminar cassada tinha o cunho de evitar novos benefícios fraudulentos, porém, em momento algum buscou identificar e punir os contribuintes desonestos. Muito pelo contrário, preferiu o radicalismo!
O que nos causa maior espanto decorre do fato de uma Liminar, que poderia ser cassada a qualquer tempo – e assim foi –, se tornar dispositivo legal, qual seja, resultando na promulgação da Lei 7.495/2016 e, consequentemente, na Resolução 1.050 da SEFAZ. Uma clara afronta a Segurança Jurídica, posto não ser cabível que uma liminar – ato precário do poder judiciário (tendo em vista que pode ser revogado a qualquer tempo, como no caso em tela) – se tornar uma norma tributária. Assim, indagamos: como será aplicada uma lei cujo motivo que lhe deu causa não mais existe?
Por outro lado, o Contribuinte/Empresário honesto, que para fazer jus ao benefício fiscal teve que preencher requisitos impostos na Lei, devendo comprovar/atender sua função social, gerar empregos, aumentar a contribuição em determinada região e, após todos os percalços, quando fora se utilizar do benefício, se viu prejudicado, ouvindo um sonoro NÃO da administração pública, sob a prerrogativa da suspensão dos benefícios.
Ora, o Contribuinte atende a finalidade do conceito de empresário previsto no Direito Empresarial, monta toda uma estrutura, preenche os requisitos estipulados, acredita estar resguardado em Lei, porém, no momento em que vai utilizar-se do benefício fiscal, se vê impedido. Tal fato, nos leva a conclusão de que o Fisco Fluminense está aí para ludibriar os contribuintes, haja vista que oferece um determinando benefício para depois frustrar seu uso.
Sem sombra de dúvidas, tal fato ao invés de evitar benefícios fraudulentos, irá afastar novas empresas, fazendo despencar a arrecadação do Fisco Fluminense, o que irá agravar ainda mais a crise. Assim fica o questionamento, será que haverá novas arbitrariedades para as empresas que se mantêm no Estado?
Parece-nos que a Lei, um dos maiores desdobramentos do Princípio da Segurança das Relações Jurídicas deixou de ser um ato crível da Administração Pública. O primeiro motivo decorre do fato do Contribuinte se vê impedido de gozar de benefício fiscal que faz jus, e, o outro, pelo fato de uma decisão de primeira instância repercutir no âmbito do Legislativo em tão pouco tempo, evidenciando a insegurança jurídica quando a dita liminar que desdobra em norma é cassada, o que lhe deixa desacreditado na Lei Fluminense!