DESENVOLVIMENTO
 
 

DISCUSSÃO DE PONTA

LITÍGIOS DE TRABALHO VIRAM CRIMES
Por Fernando Teixeira do Jornal Valor Econômico.
Colaboração do Dr. Márcio Terruggi do escritório
LEXNET de São José do Rio Preto/SP.

A tendência de criminalização de disputas tipicamente civis começa a migrar agora para a área trabalhista, ainda que por vias indiretas. Aprovada em 2000, a Lei n° 9.983, que alterou o Código Penal, foi criada originalmente para punir sonegadores da Previdência Social. Agora, no entanto, começa a ser usada como uma forma de transformar disputas próprias da Justiça do Trabalho em processos criminais.

Duas decisões da quarta turma do TRT da 2ª Região, em São Paulo, confirmam que é obrigação do juiz trabalhista denunciar crimes constatados durante o processo, inclusive aqueles previstos na Lei nº 9.983. Ela introduziu no Código Penal os artigos 297 e 337-A, que trazem uma descrição mais minuciosa a respeito da sonegação previdenciária do que a prevista na legislação anterior sobre sonegação tributária. Com isso, é possível criminalizar condutas como a falta de registro em carteira e o pagamento "por fora" de verbas trabalhistas, ou seja, diferenças observadas entre o valor efetivamente pago ao trabalhador e aquele declarado ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A nova previsão permite uma abrangência bem maior do que a mera disputa criminal, até hoje comum na área previdenciária - o crime de apropriação indébita. Em tese, as novas previsões do Código Penal permitem criminalizar condutas de relações de trabalho precárias, além das irregularidades na declaração feita ao INSS.

Advogados vêm incluindo no libelo inicial das reclamações trabalhistas a denúncia criminal devido à infração trabalhista como uma forma de pressão adicional contra o empregador. Mas, a rigor, os juízes podem fazer a denúncia independentemente do pedido, posto que é dever do juiz denunciar a ocorrência de qualquer crime, mesmo que em tese. Porém, os precedentes sobre o tema no Judiciário ainda são poucos, pois a previsão penal só atinge os fatos ocorridos após 2000, o que dá pouco tempo para a tramitação dos processos. Além disso, a legislação é pouco difundida entre profissionais da área.

Assim, tem-se que com a regra inserida no Código Penal, através da Lei n° 9.983/2000, repete-se um problema comum no Brasil ao criminalizar questões tipicamente administrativas, tais como ocorre nas áreas tributária, ambiental e de consumo, o que pode acabar banalizando a área penal, posto que o Governo objetiva a intimidação do empresariado que eventualmente sonega verbas previdenciárias.

No entanto, existe uma falha na redação do artigo 337-A, ao tratar da extinção da punibilidade. O texto diz que o sonegador tem extinta a punição quando declara e confessa as pendências, mas não fala nada sobre o pagamento. No caso de apropriação indébita, que seria juridicamente um crime menos grave, a extinção depende de pagamento.

Desta forma, com a previsão do Código Penal, como supra exposto, o potencial para causar dor de cabeça para os empregadores é imenso. Contudo, vale lembrar que, além da porta de saída da extinção da punibilidade mediante o pagamento, a ação penal só pode ter início depois de configurado o débito, o que somente é possível após o fim da fase administrativa no INSS.