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Comentários desativados em Presunção de Inocência e Presunção de Inteligência
Por Antenor Demeterco Júnior, Advogado, Desembargador Aposentado e consultor no escritório De Figueiredo Demeterco & Sade Sociedade de Advogados, LEXNET Curitiba.
Presunção de Inocência e Presunção de Inteligência
Recentemente entrou em pauta no Supremo Tribunal Federal o reexame do artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, lamentavelmente em julgamento fulanizado.
Prevê-se no dispositivo que réus só serão considerados culpados com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória que mereceram.
A condição jurídica de culpado inexiste quando um delegado de polícia representa ao Juiz em inquérito policial (inexistindo ainda, portanto, sequer processo judicial) pela necessidade de carceração do indiciado.
O delegado baseia-se, para tanto, em simples “indício suficiente de autoria“ na expressão do artigo 312 do Código de Processo Penal.
Observa-se que um delegado de polícia, lá nos fundões do Brasil, pode sugerir a prisão de cidadãos inconformados com a lei sem culpa configurada, mas, segundo certo pensamento, magistrados togados posicionados em superiores instâncias judiciais não podem prender (embora juízes o possam em inquéritos) quando a matéria fática configuradora de culpa já não pode mais ser submetida a reexame.
A chamada “prisão preventiva” (que garante a execução ulterior da pena) tem seu tempo de carceração incluído no lapso de duração da sanção ao final imposta, transmuda-se assim, de fato, em verdadeira apenação, que me perdoem os doutrinários.
No artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal deve-se enxergar no meu modesto ponto de vista (não original) não o princípio de “presunção da inocência”, mas sim o da “não culpabilidade” antecipada.
Se o indivíduo é presumido inocente pode parecer uma aberração, não só jurídica, processá-lo.
Uma apreciação extremista deste princípio tem consequências que a presunção de inteligência (compreensão) do sistema como um todo não pode admitir.
A sistemática penal universal queiram ou não os garantistas do exagero, é baseada principalmente na efetividade da pena a ser imposta ao delinquente, com o fito intimidante ou corretivo.
Permitir que este só seja preso com à ultimação do julgamento de todos os recursos cabíveis e incabíveis é entregar a efetividade da pena ao arbítrio do apenado (e ao brilho de seus advogados) em não cumpri-la.
Desmonta-se assim todo o sistema de repressão criminal, ab-rogando-se o próprio Direito Penal no seu principal instrumento, e, no presente momento brasileiro, por um ou dois votos de uma maioria de ocasião no Supremo Tribunal Federal.
A defesa social não pode ser ignorada pelos julgadores do momento, expondo o povo brasileiro livre e de bons costumes a uma enxurrada liberatória de delinquentes, alguns de alto coturno.
Qualquer modesto estudante de Direito aprende nos bancos escolares que não existem direitos ou princípios absolutos.
Dogmas dizem mais à religiosidade popular e, dependendo, a algumas ideologias políticas, do que aos operadores do Direito.
O radicalismo interpretativo, sob pena de negar a interpretação sistemática da lei, não pode ignorar que ao aplicá-la deve atender às “exigências do bem comum” (artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil).
E este é incompatível com a impunidade generalizada e ao consequente incentivo à criminalidade que dela decorre.
Gustave Le Bon no celebérrimo “Psicologia das Multidões” (1895) é pessimista ao extremo com relação à reuniões de sábios quando opinam sobre assuntos que não tenham caráter absolutamente técnico, ocasiões em que, para ele, as inteligências individuais não desempenhariam nenhum papel (cf. p. 139, ed. portuguesa, 1909).
Os tempos atuais do país exigem cautela, pois estão trazendo à baila opiniões, pronunciamentos e abaixo assinados inconformados de quem tradicionalmente não os expressaria.