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Ronaldo Behrens Especialista em Direito de Saúde Sócio do escritório Portugal Vilela Almeida Behrens – Direito de Negócios, LEXNET Belo Horizonte
Sistema de saúde e o pagamento por valor: estamos preparados?
Recentemente, tive o prazer de dar uma palestra no SAHE 2019 (South America Health Exibition), no “Fórum de Qualidade e Segurança na Saúde”, para discussão com atores importantes do sistema de saúde sobre o ‘pagamento por valor’. A proposta foi exatamente discutir formas de pagamento praticadas no sistema, uma vez que o atual “pay for performance” revelou-se insustentável para a cadeia de saúde, atualmente sendo verdadeira relação perde-perde para todos os envolvidos.
O pagamento por valor vem se destacando, de forma bastante simples, entre várias modalidades possíveis de pagamento. Especialmente entre os norte-americanos, o denominado “value-based payment” (ou pagamento por valor) representa uma tentativa de fuga de ‘pagamento por volume de serviços prestados’ em direção a um modelo mais aderente ao atingimento de alguns indicadores de qualidade; entre eles, inclusive, a percepção do cliente.
Ao estudar o assunto de forma mais profunda e, a partir das discussões havidas no Painel, que contou com a participação da Mara Machado (CEO no IQG) e da Priscila Rosseto (Gerente Nacional de Qualidade e Segurança na UHG), ficou patente que a preparação do sistema para a introdução dessa modalidade precisa ser ainda mais profunda, envolvendo até mesmo quebra de paradigma quanto ao modelo assistencial. Ou seja, em termos de resultado, de nada adianta seguir a ideia apenas por “modismo” sem a devida atenção às reais transformações necessárias.
De minha parte e sempre tentando trazer a perspectiva do paciente trouxe ao debate a pergunta sobre
o que, efetivamente, representa “valor” para este ator, reiteradamente desprezado pelo sistema. O que deseja o paciente ou o que faz aumentar sua percepção de valor recebido ao longo de um tratamento de saúde?
O relevante The Beryl Institute publicou ano passado um excelente trabalho que trouxe uma pesquisa feita diretamente com os consumidores do sistema de saúde (2000 pessoas, em 5 países, em 4 continentes) exatamente para tentar responder a esta pergunta. A resposta surpreendeu várias pessoas que atuam nesta indústria, ainda que previsível e simples:
a grande maioria das pessoas percebem como fator mais importante de valor recebido em um tratamento médico o fato de “ser ouvido” ou “ter sua opinião valorizada” pelos prestadores de serviço.
Dos dez primeiros itens escolhidos pelos entrevistados sobre o que se consideraria como atitudes que geram valor no relacionamento com o prestador de serviços de saúde, nada menos que sete desses principais estão ligados às “pessoas”, ou seja, ao capital humano disponibilizado para referido atendimento. Fluxos ou processos de trabalho e estrutura do local, embora importantes, ficaram em segundo e terceiro lugares, respectivamente.
O paciente ou o consumidor, como é denominado no trabalho do Instituto Beryl, quer e deseja que seu direito mais básico – a autonomia, seja respeitado e, para tanto, deveríamos levar em séria consideração a aplicação de medidas que facilitem uma decisão médica compartilhada. Entre essas medidas, a principal: o treinamento de pessoas do time de assistência, incluindo médicos e enfermeiros, para dar efetividade e melhorar o processo de escuta e de compartilhamento de decisão.
Podemos inovar no sistema de saúde. Podemos trazer conceitos revolucionários e práticas diferentes. Podemos automatizar processos ou introduzir a inteligência artificial. Tudo isso é positivo, evidentemente. Contudo, nada será efetivo se não trouxermos o paciente para o centro do sistema, tornando-o coprodutor do sistema de saúde, o que irá exigir, primeiramente, intenso treinamento dos profissionais de assistência.
Até lá, vamos continuar trocando a gestão pela fé!