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Ser ou não ser uma S/A : Eis a questão.

Bernardo Lopes Portugal é Advogado, Sócio do Escritório Portugal, Murad, Vilela, Almeida Behrens membro LEXNET em Belo Horizonte  Mestre em Direito Comercial pela UFMG, Conselheiro do IMMC – Instituto Mineiro de Mercado de Capitais, Membro do IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa; Membro do Comitê de Regulação da ABVCAP

 

O empreendedorismo precisa abranger diversos atributos para que um negócio nasça. Se desenvolva, cresça, atinja o seu ápice e tenha novamente o desafio de se reinventar.

Um destes atributos é a organização da empresa, lida aqui como o veículo jurídico que irá estruturar o objeto social escolhido, vertendo ali todos os recursos necessários, sejam humanos, tecnológicos, financeiros, dentro de uma linha estratégica escolhida.

Nesse sentido, uma pergunta recorrente formulada a Advogados e Contadores é contida no dilema shakespeariano do título: Ser ou não ser uma Sociedade Anônima?

Até o advento do então “novo” Código Civil de 2002, havia uma certa facilidade em responder tal pergunta levando em conta o porte das empresas. Na vigência do Código Civil de 1916, que dividia as sociedades entre sociedades civis e sociedades mercantis, aquelas organizações sem fins lucrativos ou as sociedades de profissionais liberais, como Contadores, Médicos, Arquitetos, Consultores, entre outras se uniam em torno de uma sociedade civil, normalmente escolhiam o tipo societário de Sociedade por cotas de responsabilidade limitada e se registravam no Cartório do Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Na Junta Comercial, até 2002, registravam-se as sociedades comerciais que podiam escolher entre ser uma Sociedade Anônima, uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada, uma Sociedade em Comandita ou Comandita por ações e já existia o tipo societário, sem personalidade jurídica denominado Sociedade em Conta de Participação, hoje mais reconhecido pela sigla “SCP”. E pelas características definidoras destes tipos societários, era claramente recomendável que as Sociedades Anônimas fossem destinadas para os grandes empreendimentos, mesmo que de capital fechado e para aquelas iniciativas que visavam obter investidores mais pulverizados através do acesso ao mercado de capitais, via bolsa de valores.

Ocorre que a já mencionada vigência do novo diploma legal para reger as sociedades ,qual seja a lei 10.406/2002 (Código Civil) trouxe alterações substanciais na agora denominada Sociedade empresária limitada que, a nosso ver,  deixou de ser aquele conjunto simples de regras aplicável a qualquer negócio. Explico.

Em primeiro lugar, houve uma mudança significativa quanto ao quórum deliberativo na Sociedade Limitada introduzida pelo Código Civil de 2002. Se até então a lei previa que para ter o controle de uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada era preciso de 50,01% (oumais de cinquenta por cento) do capital social, agora a legislação prevê a necessidade de para se exercer poderes equivalentes, como por exemplo o de simples alteração do endereço ou a criação de uma filial, seja necessária a aprovação de pelo menos 75% (setenta e cinco por cento) do capital social. Ou seja, mudou completamente o “jogo societário” e afetou profundamente a governança daquelas pequenas empresas que possuíam diversos sócios minoritários, por sua vez bem mais valorizados quanto ao seu poder decisório.

Outra mudança significativa e positiva, diga-se, foi a exigência de realização de pelo menos uma reunião anual de sócios, para prestação de contas, a qual deverá pois ser convocada , na forma da lei, a tempo de que seja possível a análise do balanço patrimonial, inclusive pelos sócios minoritários.Apenas com estas duas situações acima, exemplifico razões pelas quais vale a pena analisar a possibilidade de se transformar uma pequena, média ou grande empresa em uma sociedade anônima (S/A) de capital fechado.

Por ser regida por uma lei especial (6404/76 e modificações) as S/A não foram afetadas pelas regras do Código Civil de 2002. No entanto, a burocracia criada para as sociedades limitadas fez com que as regras da sociedade anônima , em muitos aspectos sejam mais simples ou mais conhecidas pelos profissionais do Direito e Contabilidade e portanto mais dinâmicas, a depender da atividade, do porte e dos objetivos de mercado de um empresa.

Voltando aos exemplos, nas Sociedades Anônimas, além de o quórum mínimo de aprovação da maioria das deliberações ser o da maioria simples (como os citado 50,01% que outrora vigiam nas antigas sociedades por quotas de responsabilidade limitada) além de a lei especial já trazer definidos uma série de previsões para a eventualidade de quóruns qualificados.

Outrossim, a Sociedade Anônima, pela própria natureza capitalista de seus dispositivos é hoje, como o advento do mercado brasileiro de seed, venture e privat eequity, o veiculo recomendado e muitas vezes exigido não apenas por investidores anjo, mas por qualquer fundo de investimento que almeje aportar recursos em uma empresa. E porquê é assim?

Ora, a sociedade anônima de capital fechado, com capital de até R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais) e até 20 sócios é muito mais recomendável para enfrentar a dinâmicas do ingresso e saída de sócios, verdadeira realidade de um mercado competitivo que se almeja atingir no Brasil. E isto se dá não apenas pelo quórum citado, mas pelas regras previstas para a organização da Assembléia Geral Ordinária, pela possibilidade de diferentes classes se ações, com direitos e prerrogativas diferentes, pela natureza de valores mobiliários das ações, que podem inclusive servir como garantias como empréstimos junto a bancos e agentes de fomento.

Todo este arcabouço se soma a características que fazem da sociedade anônima uma estratégia mais segura para empreendimentos ambiciosos:1 – o fato de ela ser, como o próprio nome indica, uma sociedade na qual o nome dos sócios não figura no Estatuto – diferente da Sociedade Limitada que traz o nome, CPF, identidade , endereço do sócios no contrato social registrado na Junta Comercial;2 – a  natureza de ser um sociedade cujo principal objetivo é a perpetuação do seu objeto social e não a relação pessoal dos sócios,

Tais características permitem, a nosso ver, um viés de atuação da sociedade muito mais profissional, o que não quer dizer que não seja possível que uma sociedade limitada também o seja. Em havendo um plano estratégico da empresa se se organizar sua governança, visando a atingir planos maiores, nos quais se vislumbre a possiblidade de atrair outros sócios ou recursos de terceiros, é bastante interessante avaliar se já não é chegado o momento de se transformar e começar a aprender a atuar dentro das regas de uma sociedade voltada para o capitalismo .O quanto antes esta mudança começar, mais rapidamente o empresário e seu negócio irão colher os efeitos positivos que as regras básicas de governança corporativaintroduzidas pela obediência à legislação da sociedade anônima implicam.

Email:  b.portugal@portugalmurad.com.br