LEXNET
Artigos
Comentários desativados em HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA NA JUSTIÇA DO TRABALHO E A DECISÃO STF
Por Sérgio Schwartsman, sócio Coordenador da área trabalhista deLopes da Silva & Associados – Sociedade de Advogados, LEXNET São Paulo.
HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA NA JUSTIÇA DO TRABALHO E A DECISÃO STF
Em julgamento finalizado no final de outubro, o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria de votos, julgou inconstitucional o § 4º do art. 791-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e, por consequência, a obrigação de pagamento de honorários de sucumbência ao beneficiário da Justiça Gratuita na Justiça do Trabalho.
Até o presente momento não foi disponibilizado o acórdão dessa decisão, de tal sorte que não se sabe, ao certo, os fundamentos da tese vencedora. Mas é importante destacar que a decisão diz respeito apenas e tão somente ao beneficiário da Justiça Gratuita, de modo que se o trabalhador não obtiver esse benefício em seu processo, permanece válida a regra da sucumbência e ele será condenado a pagar honorários.
De acordo com o art. 791-A da CLT, os honorários podem ser fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor a ação.
Já o citado § 4º do art. 791-A da CLT estabelece que “vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
Ou seja, a regra era de que, se o trabalhador, beneficiário da justiça gratuita, perdesse algum(ns) de seus pedidos, deveria pagar honorários advocatícios ao advogado da parte contrária, sendo que poderiam ser usados créditos que ele recebesse na própria ação ou em outra, para satisfação dessa dívida.
Com a decisão proferida, não poderá haver cobrança de honorários sucumbências do beneficiário da Justiça Gratuita, ainda que receba algum valor na ação ou em outra.
Vejamos um exemplo. Digamos que um empregado entrasse com uma ação, formulando pedidos da ordem de R$ 100.000,00. Se ele ganhasse, por exemplo, R$ 60.000,00 e o juiz fixasse honorários em 10%, a empresa deveria pagar R$ 60.000,00 ao trabalhador e mais R$ 6.000,00 de honorários a seu advogado, ao passo que o empregado deveria pagar R$ 4.000,00 ao advogado da empresa. Esse valor (R$ 4.000,00) poderia ser cobrado sobre seu crédito, fazendo com que ele recebesse apenas R$ 56.000,00, ainda que beneficiário da justiça gratuita.
Pois bem, a partir da decisão do STF, se o empregado for beneficiário da justiça gratuita, não terá que pagar honorários de sucumbência ao patrono da parte contrária, assim, no exemplo acima, receberá os R$ 60.000,00, seu advogado receberá R$ 6.000,00 e o advogado da empresa não receberá nada a título de verba de sucumbência.
Prevemos um elevado número de novas reclamações trabalhistas, mais uma vez com pedidos exorbitantes, pois praticamente desapareceu o risco da sucumbência, na medida em que, na imensa maioria das ações, e concedido o benefício da justiça gratuita ao trabalhador.
Isso porque, sabendo do risco de pagar honorários de sucumbência sobre os pedidos que perdesse na ação, os empregados diminuíram sobremaneira as ações e/ou os pedidos aventureiros. Agora, sem risco de condenação em sucumbência, a tendência é o retorno desse tipo de ação, aumentando a litigiosidade já existente no país.
Segundo matéria do Jornal Valor Econômico[1], “dois anos após promulgação da reforma trabalhista – as mudanças aprovadas na gestão do então presidente Michel Temer passaram a valer em novembro de 2017 –, o número de novos processos abertos na primeira instância da Justiça do Trabalho caiu 32%” (destacamos).
Prossegue a matéria dizendo que “a redução, segundo analistas, está principalmente relacionada à regra criada pela reforma que obriga a parte vencida a pagar os honorários do advogado da outra parte. Os honorários de sucumbência não eram cobrados do trabalhador antes da reforma. Além disso, a nova legislação pode obrigar o trabalhador a pagar os custos do processo” (grifamos e destacamos).
A redução persistiu nos anos seguintes, como se vê do Relatório Geral da Justiça do Trabalho 2020[2], elaborado pelo Tribunal Superior do Trabalho. Nele se verifica que “a demanda processual, em comparação com o ano anterior, diminui 15,1%; somando, ao final de 2020, 2.570.708 casos novos. Para cada 100.000 habitantes do País, 1.214 pessoas ingressaram com pelo menos uma ação ou um recurso na Justiça do Trabalho” (fls. 5) (grifamos).
Esse Relatório demonstra, sob diversos aspectos, a significativa redução de casos. Em números absolutos, nos TRTs, foram recebidos 17,6% a menos que em 2019 e nas Varas, foram recebidos 19,7% a menos que em 2019.
A redução se deu, ainda, em relação a caso novos por 100.000 habitantes, que foi da ordem de 16,5% em relação a 2019), ou ainda em novos por magistrado, que foi de 15,9% inferior ao número de 2019 para 1ª instância e 18% de redução para a 2ª instância.
Às fls. 111 o Relatório traz a evolução de casos novos nas Varas do Trabalho de 2016 (praticamente dois anos antes da Reforma Trabalhista) até 2020. Em 2106 foram, 2.754.646 casos novos, em 2017, foram 2.650.069, em 2018 (já na vigência da Reforma), foram 1.748.070 em 2019 foram 1.842.351 e em 2020 foram 1.477.336.
Desde a chamada “Reforma Trabalhista” a redução de casos novos foi significativa, especialmente se comparado aos anos anteriores à sua vigência.
Podemos afirmar, sem medo de errar, que a inclusão da condenação em honorários de sucumbência teve influência direta na redução de casos.
De fato, os empregados, sabendo que poderiam ser condenados a pagar honorários advocatícios caso perdessem a ação, diminuíram as ações infundadas; e mesmo aqueles que entraram com suas ações, no mais das vezes, não formularam pedidos descabidos e nem pleitearam valores exorbitantes, justamente pelo receio de pagar a sucumbência. Extinto esse risco, pois, repita-se, na maioria das ações é concedido o benefício da justiça gratuita, a tendência é o crescimento do número de ação e, também os valores envolvidos em cada uma delas.
E nem se argumente que seria uma forma de impedir o acesso ao Judiciário, pois não corresponde à realidade. Se o empregado entrar com a ação e ganhar tudo, não pagaria sucumbência, e modo que basta não pedir verbas indevidas que não há risco de sucumbência.
E há, ainda, um fato curioso nessa decisão do STF, pois na mesma ação, decidiram ser constitucional o § 2º do art. 844 da CLT que estabelece que “na hipótese de ausência do reclamante, este será condenado ao pagamento das custas calculadas na forma do art. 789 desta Consolidação, ainda que beneficiário da justiça gratuita, salvo se comprovar, no prazo de quinze dias, que a ausência ocorreu por motivo legalmente justificável”.
Ou seja, para o Estado (já que as custas processuais se revertem ao ente público), ainda que beneficiário da justiça gratuita, o trabalhador terá que pagar, mas para o advogado da reclamada não. Claramente “dois pesos e uma medida”.
Mas, de qualquer forma, é a nova regra que vai valer e, portanto, acabou a obrigação de pagamento de honorários de sucumbência ao beneficiário da Justiça Gratuita na Justiça do Trabalho.
[1] https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/01/04/numero-de-novas-acoes-trabalhistas-cai-32percent-dois-anos-apos-reforma.ghtml – acessada em 28.10.21
[2] https://www.tst.jus.br/documents/18640430/27418815/RGJT+2020.pdf/a2c27563-1357-a3e7-6bce-e5d8b949aa5f?t=1624912269807- acessado em 28.10.21