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INVESTIDORES ANJO:CATALISADORES DO MERCADO DE PARTICIPAÇÕES BRASILEIRO

Por: Bernardo Portugal, sócio do escritório LEXNET Belo Horizonte, Portugal Murad- Direito de Negócios, Diretor de Relações Institucionais da Confrapar S/A e Conselheiro da ABVCAP.

Com a recente trajetória da queda da taxa de juros no Brasil – a SELIC foi mantida em 7,25% ao ano pelo COPOM – estamos cada vez mais inseridos em uma economia onde vale mais a pena ter o dinheiro aplicado em negócios de economia real do que deixar o dinheiro no banco, qualquer que seja a aplicação, comparados os riscos, é claro.

Os analistas defensores de investimentos em imóveis farão suas ponderações; aqueles mais apaixonados com o potencial da Bolsa de Valores dirão o contrário, cada um defendendo o seu mercado. O fato é o que realmente importa no momento atual do Brasil: Investir em negócios geradores de caixa e de margem de lucro.

Daí advém a onda de ?Investidores Anjo?, que se organiza pelo Brasil a fora e cujo melhor exemplo são os ?Anjos do Brasil?, liderada por Cássio e Maria Rita Spina, que promoveram recentemente a ?1ª Conferência Nacional dos Anjos?, em São Paulo, onde muito se discutiu sobre a relação entre Investidores Anjo e os fundos de Venture Capital. Vários pontos merecem atenção e devem entrar na pauta da indústria de participações do país para acelerar o seu desenvolvimento.

Uma importante discussão a respeito do tema é sobre o tamanho do investimento. O empreendedor que consegue obter um Investidor Anjo para alavancar a sua ideia, muitas vezes ajudando-a a sair do ?Power Point?, poderá utilizar tal fato como um qualificador do seu projeto ou empresa, quando for buscar um fundo de investimento de venture capital, em uma próxima rodada de capitalização. Isto porque, convencer alguém a alocar parte de sua poupança pessoal em um negócio de terceiros é, em si, um mérito.

No entanto, ao negociar com um Investidor Anjo, o empreendedor deve ter o cuidado de não entregar um percentual muito grande de seu negócio, seja porque pode se tornar pouco atrativo ele mesmo ficar como minoritário logo no início de uma longa jornada empreendedora, ou porque pode precisar ter um estoque de equity para reter talentos e, principalmente, para negociar outras rodadas de investimento que, com seu negócio se desenvolvendo bem, serão necessárias.
Podemos considerar que na média do mercado brasileiro os grupos de Anjos normalmente entram com um mínimo de 15% e máximo de 30% da empresa investida. Cenário diferente dos Estados Unidos, onde esta parcela tende a ser menor pela quantidade de investidores disponíveis para competir pelos ativos nascentes.

O empreendedor precisa estar ciente de que a entrada de um Investidor Anjo em uma empresa recém-criada acarreta mudanças importantes. A mais urgente é a transformação do novo negócio em uma sociedade anônima de capital fechado, pois a Lei das S/A é muito mais adequada para reger as relações entre investidor e empresa investida, pelo seu caráter capitalista, onde prevalecerá sempre o interesse na continuidade do negócio e na busca do resultado sob os interesses pessoais dos sócios.

Alguns Anjos defendem que isto é desnecessário, pois as empresas são pequenas e algumas optantes pelo regime tributário do Simples. Uma empresa que tenha adotado o tipo societário de S/A não pode manter-se ou ingressar nesse sistema, que tem limites de faturamento anual baixo.

Mas é preciso ter em mente que as atuais regras aplicáveis às Sociedades Limitadas, trazidas pelo já não tão novo Código Civil de 2002, são muito rígidas, pouco dinâmicas e, a meu ver, muito burocráticas para o ambiente do capital empreendedor. Por isso, a defesa da transformação em S/A, antes do recebimento de qualquer Investimento Anjo ou futuramente de um fundo de venture capital. Já ser uma S/A, portanto, será um diferencial para a empresa ao se apresentar aos fundos que selecionar como potenciais alvos. Ser uma Sociedade Anônima, com uma governança corporativa mais estruturada do que se fosse uma Sociedade Limitada poderá facilitar e agilizar o fechamento do deal.

É recomendável também, que seja formalizado um Acordo de Cotistas ou Acionistas (nas S/As), dentro do qual serão estipulados de forma expressa os direitos e obrigações de cada parte, para evitar mal entendidos e divergências por falta de clareza nas negociações, criando as regras de governança corporativa que regerão a relação entre investidor e investida.

No sentido de aprimoramento desta governança, há ainda mais algumas dicas que valem ser ditas. Independente de ser uma Sociedade Limitada ou Anônima, uma recomendação unânime no evento e bastante importante para alavancar o crescimento do negócio, é a de que o empreendedor possa tentar trazer para perto de si, no dia a dia da gestão da empresa, algumas pessoas renomadas e experientes no mercado que ele vislumbra como sendo sua arena competitiva.

Isso significa a criação de um Conselho Consultivo ou, se já for uma S/A, de um Conselho de Administração, no qual terão assento estes ?notáveis?, que não precisam ser necessariamente famosos, mas sim profissionais altamente capacitados e experientes no mercado que a empresa atua. O objetivo é que esses executivos possam aconselhar, sugerir melhorias, ou ainda criticar de forma construtiva os caminhos que a empresa vier a trilhar, ajudando-a a achar atalhos mais rápidos na busca pelo sucesso no seu segmento.
Uma das tônicas dessa relação é que o investimento de capital empreendedor seja ele de anjos, venture capital ou até mesmo de private equity, nunca pode ser baseado somente no aspecto financeiro. O Sócio Investidor que ingressar na empresa precisa também agregar sua expertise e o seu networking, abrindo portas para a empresa.

Além disso, o investidor precisa ser uma referência para apontar melhorias de cunho administrativo financeiro, com objetivo de aperfeiçoar sempre a gestão do negócio. Muitas vezes a parceria chega até ao nível pessoal, com os investidores dando conselhos aos empreendedores em momentos difíceis que enfrentarão durante o percurso, após receberem o investimento.

É claro que como em qualquer relação ?nem tudo são flores?, e um dos pontos onde pode surgir possibilidade de conflito entre um Investidor Anjo e um fundo de venture capital é justamente quando o empreendedor estiver negociando uma nova rodada de investimento e o fundo tiver que analisar o acordo de cotistas ou acionistas que foi firmado lá atrás com um ou mais Anjos.

Isto porque, além do percentual de investimento que já foi mencionado anteriormente, temos outras cláusulas que entram em discussão como: anti-diliuição, pay to play, earn outs, preferências em dividendos, drag along, entre outras tantas, objetos deste tipo de negociação que podem se tornar uma queda de braço entre o Fundo de Investimento e o(s) Investidor(es) Anjo(s).

Obviamente, se a empresa for atrativa e apontar um potencial de alta taxa de retorno, uma boa negociação será sempre possível. O ponto de atenção aqui, mais uma vez, é que o empreendedor, quando tiver a primeira oportunidade de receber um investimento, seja de um familiar, de um amigo ou de um Investidor Anjo, busque se cercar de bons assessores legais. Principalmente para que possa realizar um acordo que mais tarde não venha a se tornar um empecilho para a entrada de um novo sócio, estratégico ou financeiro.

Por fim, mas não menos relevante, volto em um tema que tenho repetido em diversas palestras: A necessidade de organizar a documentação da empresa por meio do procedimento de pré-due diligence legal. Esse processo antecipa a solução de problemas, mitiga os riscos do investidor/comprador e pode acelerar o fechamento da operação, aumentando significativamente a chance de recebimento de investimento, pois diferencia a empresa-alvo das demais.

Pode parecer algo óbvio demais, porém a realidade é que, em um ambiente onde a maioria das empresas ainda prescinde de uma organização mais apurada com seus documentos contábeis, financeiros, administrativos sendo geridos de forma sistemática e podendo ser auditados a qualquer momento, aquelas que possuírem tal organização têm a oportunidade ímpar de se destacarem, e isto pode fazer a diferença na negociação final.

Nesse sentido, o recebimento de um Investimento Anjo, antes de uma empresa buscar o aporte de um fundo de Venture Capita,l pode ser bastante pedagógico. Ao ter um sócio que passe a exigir relatórios periódicos, balanço coerente com a realidade, certidões negativas atualizadas, formalização das decisões empresariais, criação de alçadas de gestão, entre outros exemplos de boa e básica governança corporativa, a empresa estará de certa forma, ?em treinamento? para quando obtiver um investimento de Venture capital. E, com certeza, ao vivenciar a experiência de ter que lidar com um Investidor Anjo, poderá se sair melhor quando as exigências aumentarem no ingresso do Fundo de Investimento.

Em síntese, o ambiente no Brasil é hoje muito propício e que, observadas algumas questões como as que aqui foram levantadas, a tendência é de que o Investidor Anjo possa ser cada vez mais catalisador do mercado de participações, ajudando a acelerar novos investimentos nas empresas investidas por gestores de Venture Capital ou Private Equity, alimentando o deal flow. É o que se deseja e espera-se que possamos construir, em prol do dinamismo do mercado de participações no Brasil.