Por: Sérgio Shwartsman – Lopes da Silva & Associados – LEXNET São Paulo.
O Governo está anunciando novo Projeto de ratificação da Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a qual dispõe sobre o término das relações de trabalho por iniciativa do empregador, prevendo, basicamente que tais demissões somente podem ocorrer no caso da empresa enfrentar, comprovadamente, crise econômico-financeira, estiver passando por mudanças tecnológicas ou ainda se o empregado demonstra claramente não ter condições para o desempenho das funções para as quais fora contratado, sendo que deverá justificar por escrito as razões da dispensa e se não houver concordância do empregado, o caso deve ser apreciado pelo Poder Judiciário.
Pois bem, a nosso ver, esse Projeto, embora pretenda conceder maiores benefícios aos empregados, na verdade, se consubstancia em verdadeiro “tiro no pé”, pois irá engessar de tal forma os processos de demissão dos trabalhadores, que, por certo, acabará por diminuir sobremaneira as próprias contratações.
Ora, se o empresário sabe, de antemão, que terá diversas problemas para dispensar um trabalhador, inclusive podendo ter que se socorrer do Poder Judiciário para isso (e se sabe muito bem que no Judiciário a decisão definitiva demora vários anos para sair), irá pensar muitas vezes antes de contratar. Possivelmente, estimulará soluções paralelas, sem garantia para o trabalhador, como aconteceu no segmento rural, com o surgimento do “gato” que, simuladamente contrata temporariamente o trabalhador e, assim, evita o vínculo com o verdadeiro empregador. Ou seja, em que pese pretender dar maiores garantias de emprego aos trabalhadores, na verdade a nova Ratificação da Convenção nº 158 da OIT irá restringir ainda mais o mercado de trabalho e levar mais e mais trabalhadores à informalidade, que é justamente o que vem se tentando combater nos últimos anos.
Veja-se que, antes de tudo, o Projeto de nova Ratificação da a Convenção nº 158 da OIT contém flagrante incongruência do Projeto com a política macroeconômica governamental, especialmente no âmbito da Reforma Tributária.
Como dito, nos últimos anos o Governo vem tentando combater o desemprego e a informalidade no mercado de trabalho, inclusive com medidas adotadas no projeto de Reforma Tributária, para diminuir os encargos sobre as folhas de salários das empresas e, assim, estimulá-las a novas contratações.
Se o Governo vem buscando diminuir os encargos sobre a folha de salários para gerar novos empregos, evidentemente não pode querer acabar com a possibilidade dos patrões dispensarem seus empregados, quando necessário e ao amparo dos direito legais já existentes, sob pena de configurar grave incongruência de comportamento. ,
Outro ponto a ser ponderado é que o que se pretende NÃO É NOVO. Essa mesma Convenção nº 158 da OIT já fora aprovada pelo Brasil, através do Decreto Legislativo nº 68 de 1992 e foi promulgada pelo Decreto nº 1.855 de 10 de abril de 1996. Durante todo o seu período de vigência, não produziu os efeitos pretendidos, acabando por ser denunciada (cancelada) através do Decreto nº 2.100, em 20 de dezembro de 1996.
Ou seja, há mais de 10 anos já se tentou a aplicação da mesma Convenção no país, visando conceder melhores garantias de emprego aos trabalhadores e não se alcançou qualquer resultado útil. O que nos leva a indagar: por que seria diferente agora?
Além disso, enquanto a Convenção nº 158 da OIT esteva vigorando, diversos casos foram levados à apreciação dos nosso Tribunais e essas Cortes, quase à unanimidade, reconheceram que não se poderia reconhecer a garantia contra dispensa pretendida pela Convenção, posto que com isso estar-se-ia ferindo a Constituição Federal, a qual prevê que tais garantias contra dispensa arbitrária ou sem justa causa devem ser estabelecidas por Lei Complementar art. 7o, inciso I), e que a Convenção nº 158 da OIT não substituiu aquele Norma exigida pela Carta Magna.
Portanto, se vamos incorrer no mesmo erro da inconstitucionalidade da medida, mais uma razão para se acabar no nascedouro com a proposta governista.
Além do mais, o já citado inciso I do art. 7o da Constituição Federal, afirma que são direitos dos trabalhadores “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”. Ou seja, a própria Constituição já estabelece a diretriz que deverá ser observada pela Lei Complementar que vier a ser editada, no sentido de que deverá prever a indenização compensatória dessas dispensas, de tal sorte que, na verdade, a regulamentação não poderá impedir a dispensa, mas sim prever a indenização compensatória para as mesmas.
E tais compensações pecuniárias já existem no sistema jurídico vigente, pois a empresa, para dispensar sem justa causa um trabalhador, deve lhe conceder um aviso prévio de ao menos 30 dias (em alguns casos os Dissídios Coletivos – reconhecidos como válidos pela própria Constituição – estabelecem até prazos maiores), deve lhe facultar a liberação do FGTS com pagamento de multa de 40% sobre o saldo do mesmo e ainda dá direito ao empregado de receber o Seguro Desemprego (de até 5 parcelas, hoje, com teto máximo de R$ 776,46).
Portanto, se a indenização compensatória pela dispensa imotivada já existe e a Constituição Federal exige Lei Complementar para regulamentar essa questão, evidente que não há razão de ser para a nova ratificação da Convenção nº 158 da OIT.
Além do mais, uma questão importante precisa ser analisada, em relação ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
O FGTS foi criado justamente para acabar com estabilidade do trabalhador (para o empregado que completasse 10 anos de serviços na mesma empresa), prevista no art. 492 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT ); porém, se vamos voltar à época da estabilidade, por que então manter o FGTS e onerar ainda mais os empresários? Se o FGTS substituiu a estabilidade, voltando esta, não há mais razão para manter aquele, devendo se acabar com o FGTS e como ele, todas as melhorias conquistadas pela população em geral, visto que seus recursos são utilizados para fins de investimentos do Governo em infra-estrutura, saneamento, educação, etc..
Dessa forma, entendemos que se a intenção era garantir maiores benefícios aos trabalhadores, a nova ratificação da Convenção nº 158 da OIT será um tiro que sairá pela culatra, pois com tantas complicações para dispensar um empregado, inclusive com eventuais gastos mais elevados para isso, cada vez mais os empregadores vão preferir a informalidade e os números de desemprego, ao invés de diminuírem, tendem a aumentar diminuir significativamente, além de ser necessário, por questão de coerência, se acabar com o FGTS e o benefício econômico que ele representa para o trabalhador.