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NOVOS DIREITOS PARA OS EMPREGADOS DOMÉSTICOS - EQUIPARAÇÃO AO TRABALHADOR URBANO - RISCO DE MAIOR INFORMALIDADE

Por: Sérgio Schwartsman, advogado do escritório LEXNET São Paulo, Lopes da Silva &Associados.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, em votação simbólica, a proposta de emenda à Constituição (PEC) 66/2012, que garante aos empregados domésticos os mesmos direitos dos demais trabalhadores urbanos.

A proposta altera o parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal, aumentando o rol de direitos previstos aos trabalhadores urbanos em geral que também passariam a ser garantidos aos domésticos.

Atualmente, já que a referida PEC ainda não foi definitivamente aprovada e, portanto, não produz efeitos, pela Constituição Federal, aos domésticos são garantidos os seguintes direitos: (i) salário mínimo; (ii) irredutibilidade de salário; (iii) 13º salário; (iv) férias acrescidas de 1/3; (v) licença gestante; (vi) licença paternidade; (vii) aviso prévio; (viii) aposentadoria e integração à previdência social. Além desses há outros direitos garantidos pela legislação infraconstitucional, especialmente a Lei nº 5.859/1972, com as alterações introduzidas pela Lei nº 11.324/2006 e Decreto nº 3.361/2000 que regulamenta a matéria.

A alteração pretende conceder aos domésticos também os seguintes direitos: (i) garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; (ii) proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; (iii) duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; (iv) repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; (v) remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; (vi) redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; (vii) reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; (viii) proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; (ix) proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; (x) proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.

Correndo o risco de ser “apedrejado” por alguns, que dirão que sou contra os empregados domésticos e quero vê-los discriminados, parece-me que a pretensão do PEC em questão não se justifica e ainda corre o risco de, em sentido contrário ao que pretendido, aumentar a informalidade nas relações de trabalho doméstico.

A não justificativa, a meu ver, se dá principalmente e com base no Princípio da Isonomia, previsto no art. 5º da Constituição Federal, que estabelece que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”.

Esse Princípio da Isonomia consiste não em tratar todos de forma exatamente igual, mas sim de tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual ou, nas palavras de Nelson Nery Júnior “dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades”.

Evidentemente a situação do empregado doméstico não é a mesma do trabalhador urbano em geral, assim, como a situação do empregador doméstico não é a mesma do empregador em geral. As peculiaridades dos serviços geram essa distinção, que faz com que esses domésticos sejam tratados de forma desigual, sem que isso signifique que sejam empregados “de segunda categoria”.

Não se está dizendo que os domésticos são empregados de não devam ter direitos assegurados, pelo contrário, a nosso ver, essa questão não permite nem mesmo início de debates. Os direitos básicos devem, sempre, ser garantidos. A questão importante é se entender quais direitos devam ser garantido. E, ainda em nossa visão, aqueles diretos hoje garantidos, são os adequados ao trabalhador doméstico, diante das peculiaridades da atividade.

A inexistência de limitação de jornada e direito de horas extras, por exemplo, a nosso ver, se enquadra nessa peculiaridade do doméstico.

Como se adequar a jornada de 08 horas diárias, de modo que o doméstico possa atender as necessidades do empregador. Como adequar essa jornada para que possa, por exemplo, servir o café da manhã, o almoço e o jantar à família? Ou adequar ao motorista que tem que levar as crianças à escola pela manhã, depois buscá-las perto do horário de almoço e no final do dia buscá-las em atividades extracurriculares? E “nesse meio tempo”, em que não está dirigindo, ainda assim deverá ser considerada jornada de trabalho a ponto de justificar horas extras?

Convém ressaltar que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), também aplicável aos domésticos, naquilo que não for incompatível com a Lei nº 5.859/1972, estabelece que o intervalo do empregado sujeito a 08 horas diárias de trabalho, não pode ser superior a 02 horas, salvo previsão em Norma Coletiva (art. 71). Assim, se a cozinheira trabalhar, por exemplo, das 08h00min às 18h00min horas com 02 (duas) horas de intervalo, dificilmente poderá assistir ao empregador no jantar. Se o motorista trabalhar, por exemplo, das 07h00min às 17h00min horas com 02 (duas) horas de intervalo, dificilmente poderá assistir ao empregador na busca dos filhos em atividades extracurriculares. Tudo isso, embora nos intervalos, muitas vezes não tenham atividades a desempenhar.

Para que possa haver regulagem dessa situação, indispensável então, que se faça uma Norma Coletiva prevendo o intervalo superior, para adequar a essa situação. Nada garante que isso vá ocorrer.

E a questão ainda do adicional noturno. Como se saber se o empregado está trabalhando à noite, ou se apenas está em casa?!

Outra questão importante, diz respeito à situação do empregador, pois se estendem os benefícios ao empregado, mas não se criam mecanismos para proteger o empregador doméstico, na mesma proporção do empregador em geral.

Para os empregadores em geral, todos os custos com o empregado são dedutíveis para apuração de lucros e pagamento de tributos. Já no caso do doméstico, a legislação do Imposto de Renda, exemplificativamente, permite apenas a dedução da contribuição previdenciária, de um único empregado e com base em um salário mínimo mensal.

Veja que essa situação já nos parece errada, pois se o empregador tiver mais de um empregado, somente poderá fazer dedução em relação a um deles; e se receber mais que o salário mínimo, não importa também, as deduções são limitadas a esse teto. Além disso, permite apenas a dedução do valor gasto com as contribuições previdenciárias, os demais pagamentos, inclusive de salários, não são dedutíveis.

Agora se acrescem despesas ao empregador doméstico, mas não lhe dá a contrapartida de poder deduzir todos esses gastos em seus impostos.

Pois bem, todas essas alterações vão na contramão da idéia que o Governo defende a anos, que é diminuir a informalidade.

Se com os direitos existentes hoje, a informalidade já é grande (e errada), aumentando-se os custos, ainda mais sem contrapartida, creio, firmemente, que o empregador doméstico, mais do que nunca, não terá o menor interesse em registrar seus empregados e aqueles que já o fazem, em face do aumento do custo, possivelmente deixarão de fazê-lo.

Dessa forma, entendo que se a intenção era incentivar o registro dos empregados domésticos, o tiro saiu pela culatra, pois com tantos novos gastos, cada vez mais os empregadores vão preferir a informalidade e o número de domésticos registrados, ao invés de aumentar, tende a diminuir significativamente.