Por: Anamaria Klein Buffara e Pedro Mansur Buffara – Buffara & Mansur Buffara Advogados, LEXNET Porto Alegre.
Desde 23 de dezembro de 1997, as embarcações “Mariscal José Felix Estigarribia” e “General Bernardino Caballero”, ambas pertencentes ao governo paraguaio, seguem atracadas nas docas de nº 04 e de nº 05, do cais do Porto Mauá, em Porto Alegre/RS. Faziam transporte de cereais na costa brasileira.
De acordo com as inspeções efetuadas por representantes da Diretoria de Portos e Costas e da Delegacia da Capitania dos Portos em Porto Alegre, além seus precários estados de conservação, já tiveram vários de seus componentes e acessórios subtraídos, acumulando lixo, ferrugem e significando riscos à saúde pública e ao meio ambiente.
Apesar de já ter sido efetuada a retirada de mais de quatro mil litros de diesel das embarcações, há resíduos do óleo misturados com água, nos porões dos navios, acumulando-se ano a ano, o que pode provocar contaminação ambiental, visto o contato direto com as águas do rio Guaíba.
Esta degradação visível e diária, sem qualquer manutenção poderá acarretar o assentamento do navio, com prejuízos incalculáveis ao meio ambiente e aos cofres públicos.
Desde a falência da empresa proprietária das embarcações, trava-se uma disputa judicial, tanto no Brasil como no Paraguai. Os tripulantes abandonados junto às embarcações ajuizaram ações trabalhistas, postulando o seqüestro dos cargueiros como garantia do juízo. Também há notícia de processos junto ao governo paraguaio, inclusive de parte da Superintendência de Portos e Hidrovias – SPH, com a retenção judicial dos cargueiros como forma de pagamento da dívida de mais de um milhão de reais, decorrente de multas e taxas ao Porto.
Esta situação, devido ao descaso do Poder Público, é um dos impeditivos da revitalização do Porto, do incremento do transporte multimodal e das reduções no preço e no tempo para travessia do Guaíba, impondo, a responsabilidade civil subjetiva do Estado, nos termos do art. 43 do atual Código Civil Brasileiro, onde “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.”, com o respaldo das leis n˚s 9.605/98, 9.966/2000 e da Carta Política Brasileira.
Mesmo não havendo relação direta entre o prejuízo e ação direta dos agentes causadores, responderá o Estado pela omissão na fiscalização ou na prevenção. O Princípio da Prevenção lida com o conhecimento de risco concreto. No caso presente, sabe-se que, por exemplo, o contato de resíduo de óleo diesel com o rio Guaíba, ocasionará um dano, mas não se poderá ter certeza sobre as suas reais proporções.
O fundamental é saber em qual momento o Estado deve responder pelo dano e por sua reparação na medida em que ele não foi o causador.
O caso das embarcações atracadas no cais do Porto de Mauá demonstra, pelos estudos realizados, a existência do perigo de rompimento do casco dos navios onde se encontra uma grande quantidade de resíduos de óleo diesel.
A legislação específica cita, textualmente, os órgãos da Marinha e elenca os tipos de autuação porque reconhece a responsabilidade da Marinha quando trata de poluição praticada por embarcações.
No caso ora focalizado, o Estado pode ter descumprido seu dever legal de polícia administrativa, podendo caracterizar o serviço como ineficiente. O Poder Público teve e tem conhecimento do dano iminente como demonstram os ofícios expedidos pela Delegacia de Capitania de Porto Alegre endereçadas a SPH.
A propósito, uma solução para os riscos causados por este tipo de embarcações seria a interposição de uma ação judicial com pedido de antecipação de tutela para impor, aos proprietários das embarcações e à Administração Pública, uma obrigação de fazer, ou seja, de realizar a remoção dos navios.
Somente através de medidas objetivas e pressões de parte das comunidades locais ou pelos legisladores, é que será possível fazer com que seja reconhecida a responsabilidade ambiental sob determinados danos ecológicos, especialmente pelo Poder Público, para que ele, efetivamente, exerça seu poder de polícia e atue preventivamente, de forma a evitar os aludidos danos, irreversíveis e imediatos.
Caso haja derramamento dos resíduos de óleo acumulados nos porões dos navios, o Poder Público deverá responder por omissão em razão da falta de prevenção e fiscalização já mencionadas.