Por: Luiz Eduardo Leme Lopes da Silva*.
A diplomacia brasileira é conhecida, desde há muito, pela qualidade de seus integrantes; habilidade no trato das questões mais complexas e reconhecida internacionalmente como grupo de escol.
Pois foi exatamente sobre o Itamaraty , a casa de Rio Branco, que o atual Governo Brasileiro resolveu assentar um dos pilares de seu projeto partidário de permanência. E, partindo deste objetivo, traçou ambicioso plano de conquista de espaço que permitisse a projeção de seu ideário no mundo desenvolvido e o lançamento de seu líder à condição de par daqueles que efetivamente regem os destinos do mundo.
O desenho de inserção supunha o exercício da liderança política da América do Sul, estribada no tamanho da economia brasileira – a mais complexa do continente – e no carisma auto proclamado do Presidente da República que, iludido pelo sucesso de sua bem sucedida carreira política, à qual dedicou com exclusividade toda sua vida adulta, imaginou poder exercer seu poder de sedução junto a terceiros povos.
Acrescia-se ao projeto a formação de um eixo de países de economia emergente com grande potencial, no hemisfério norte, integrado pela China e pela Índia, países com nível de crescimento do PIB respectivo em taxas muito elevadas já por mais de dez anos. De quebra buscava-se, ainda, a presença e liderança no continente Africano, não apenas nos países lusófonos mas, também, em outros com os quais o Brasil jamais teve fortes relações de qualquer espécie e que representam ínfimos mercados a serem conquistados para a economia nacional.
Completava o desenho a conquista de posições relevantes em organismos multilaterais tais como a OMC – Organização Mundial de Comércio e o BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. Finalmente, a jóia da coroa, seria a admissão como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU – Organização das Nações Unidas onde sentar-se-ia o Brasil ao lado das grandes potências.
Projeto complexo, de estruturação difícil e implantação demandando a mais fina habilidade diplomática do mundo foi, no entanto, entregue a mãos incompetentes. Desdenhou-se o quadro profissional de alta qualidade para, em processo de aparelhamento partidário das funções diplomáticas, incumbir da tarefa profissionais menos qualificados , com o poder compartido entre ao menos três condutores – o assessor presidencial internacional Marco Aurélio Garcia; o Ministro das Relações Exteriores Celso Amorim e seu Secretário Geral, Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães.
O triunvirato no poder diplomático não teve, jamais, desde sua assunção aos cargos, capacidade de visão ampla que lhes permitisse a correta avaliação dos problemas que se lhes colocavam à frente.
Iniciaram pela convocação de reunião, com vistas à formação, do grupo denominado CASA – Comunidade de Nações da Ameria do Sul, do qual deveria emergir a liderança pessoal do Presidente. Além do pouco entusiasmo manifestado desde sua constituição, o fracasso não se fez tardar. As reuniões subsequentes já não contavam sequer com a presença dos Presidentes dos demais países que, de quebra, ainda passaram a manifestar má vontade pelo que entenderam ser ilegítima pretensão do país.
Neste interregno, viagens sem sentido à África desenhavam a inutilidade do programa político, emoldurado ainda por bobagens ditas em alto em bom som, que devem Ter causado frouxos de risos em todas as Chancelarias do mundo, tais como o comentário presidencial de ser a capital da Namíbia uma “cidade limpinha, que sequer parecia africana” ou os deslavados elogios ao ditador que, por se perpetuar no poder por mais de 30 anos, causou inveja ao líder que disse então estar ali para aprender como se consegue isso.
Não pararam neste ponto, para reavaliar o processo. Prosseguiram, com empáfia, como se resultados espaventosos estivessem sendo conseguidos. Na Índia, pífios acordos foram celebrados e se hoje melhoram as relações comerciais entre os dois países , tal se deve ao ingente esforço do setor privado nacional e indiano que estão buscando suas complementariedades e celebrando diretamente negócios de alguma expressão. Com a China não foi diferente. Fazendo ouvidos moucos aos conselhos e tapando os olhos para a realidade, não se pejaram os condutores da desastrada política externa em apressar-se a reconhecer como sendo “de mercado “a economia chinesa, eivada de subsídios e com custos de produção extremamente baixos dada o praticamente inexistente custo trabalhista (operários trabalham por salários menores do que o insuficiente mínimo nacional e não há custos onerando tais pagamentos com no Brasil, onde o custo da folha de salários pode chegar a mais de 100% dos salários efetivamente pagos). Assim procedendo, abriram as portas da OMC à China mas não recebemos a esperada recompensa: fomos vetados exatamente pela China como integrantes permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Seguem-se os erros sistemáticos e lá se foram as candidaturas brasileiras à chefia da OMC e do BID, derrotadas inclusive com a clara oposição de nossos vizinhos mais próximos e integrantes do hoje quase falido Mercosul: Uruguai e Argentina. Esta, aliás, além de estar ressentida pelo que entende traição do Brasil que não a apoiou quando do processo de renegociação de sua dívida externa, esconde suas fraquezas econômicas atrás de alegações de existência de “assincronias” nas respectivas economias para obter, a cada momento e em maior expressão, concessões do Governo Brasileiro que as atende para manter a farsa da liderança perdida. Como se já não fosse sabido de antemão que um país como o Brasil, com praticamente 5 vezes mais população e um PIB inúmeras vezes maior do que o da Argentina viesse a levar vantagens nas trocas comerciais que se viriam realizar. Assim, o que se conquistara quando da celebração do Tratado de Assunção – que criou o Mercosul – foi perdido pela condução amadora das relações com o maior parceiro no bloco.
Neste quadro de desmanche do plano traçado, surge no cenário latino-americano o populista Hugo Chaves que, escorado pela enxurrada de dinheiro proveniente do petróleo de que dispõe sua Venezuela, assume esponte própria o papel de líder condutor do processo político no continente e, inspirado pelo velho ditador Fidel Castro – que o apoia e já quase o ungiu como seu sucessor – passa a liderar um processo de desagregação que soterra, de vez, o projeto brasileiro. Com efeito, sem pejo de vender seus recursos naturais aos USA, Chaves passa a invectivar aquele país, criando factoides políticos e liderando o eixo da pobreza, ao qual o Brasil, avidamente, se filia.
Deixando de lado exemplos produtivos dos países como o Chile e o México, que foram buscar sua parceria exatamente junto à maior potência do mundo, alavancando sua potencialidade econômica e, consequentemente , de desenvolvimento, buscamos a companhia fácil e populista daquele que, de maneira deletéria, alcança e abala a estrutura continental. Combate-se a ALCA para formar a ALBA, liderada por Chaves e Fidel, trazendo de contrapeso o mais novo discípulo, o não menos populista Evo Morales , lider cocalero ( dos plantadores da coca, matéria prima da cocaína) . Simultaneamente, ataca-se o Pacto Andino , exatamente porque também busca aproximação com os USA e ameaça o fim daquele acordo regional pela tão só retirada da Venezuela. Ameaça e intervém nos negócios internos do Peru, para dar suporte a mais um populista, Humala, aquele cuja mãe quer matar todos os homossexuais e o irmão, da prisão, disputa a presidência com o discurso de matar todos os “traidores da pátria”, seja lá o que isso queira dizer.
Finalmente, colhe-se o fruto maior: a expropriação de bens nacionais na Bolívia, colocando em risco o plano estratégico da matriz energética do país que, na melhor das hipóteses, será confrontado com elevado aumento de custo do produto integrado de forma definitiva à produção industrial e à geração de energia elétrica no país, além, é claro, do consumo doméstico e como combustível de parte da frota de veículos. E, nossa política externa, no caso, foi apenas a de elogio à “soberania boliviana”, como se o que estivesse em jogo não fossem os interesses do Brasil. Que, aliás, de concreto, produziu apenas pífia reunião de presidentes – com o onipresente Hugo Chaves dirigindo o circo, sem qualquer razão para ali estar, vez que não adquire, produz, compra ou distribui o gás boliviano. Piora o quadro as declarações do chanceler Amorim perante o Senado de que, em particular, o Presidente admoestou seus parceiros, por temer a tomada de atitude pública.
Pobre Brasil. O sonho bom de poder perdeu seu caráter de criatividade. Transformou-se em pesadelo. Acorde Presidente e dê início efetivo à gestão dos interesses nacionais no plano internacional.
*Luiz Eduardo Lopes da Silva
Advogado – sócio titular de Lopes da Silva e Guimarães Adv. Associados
Filiado LEXNET em São Paulo.